Como calcular FV para clientes do Grupo A

No último post, expliquei sobre a diferença de demanda e consumo e as diferenças tarifárias. Nesse post, vou falar sobre quais valores de consumo se usar como base para calcular FV para clientes do grupo A e sobre o fluxo de caixa para esse tipo de cliente.

Na figura abaixo vemos a representação do sistema elétrico da geração até o cliente final.

setor-eletrico
detalhe-1

A instalação de um típica de um cliente do grupo A é:

cliente-grupo-a

Precisamos agora conhecer algumas coisas. Quando solicitamos a concessionária a energização de um cliente do grupo A, duas informações são importantes:

1) Potência instalada: A potência instalada é a soma das potências dos transformadores, em kVA. Esse valor é importante para a concessionária, pois ela precisa estudar se seu sistema tem condição de atender a toda essa carga, e fazer as adequações necessárias. Esse valor também servirá como balizador da máxima demanda que esse consumidor pode contratar.

2) Demanda contratada: A demanda contratada é o valor que o cliente, após estudo por um especialista, contrata junto a concessionária (leia o post Demanda? Fora de Ponta? Horo Sazonal? Traduzindo o “Elitricitrês”). Esse valor está limitado a 0,92 x a potencia instalada.

Dimensionando a FV

Como vimos no post passado ( Demanda? Fora de Ponta? Horo Sazonal? Traduzindo o “Elitricitrês” ) a conta de um cliente do grupo A tem dois consumos, o consumo FP e o consumo na ponta. A principal dúvida que as pessoas tem é qual o consumo que uso para calcular quanto meus sistema de FV precisa gerar. Lembremos que a geração de energia FV se dá no período do dia, ou seja, praticamente apenas no horário fora de ponta (o medidor da concessionária medirá separadamente também a energia injetada), para facilitar o exemplo, vamos considerar que só há excedente de energia no horário fora de ponta. De acordo com o Caderno Temático de MicroGeração e MiniGeração Distribuída, publicado pela ANEEL, temos:

Para as unidades consumidoras que dispõem de tarifa horária, a energia injetada deve ser utilizada, prioritariamente, para abater o consumo mensal no mesmo período (ponta ou fora ponta). Caso haja sobra, esse saldo será utilizado para reduzir o consumo no outro posto tarifário, após a aplicação de um fator de ajuste.

Vamos pegar então uma das contas do post anterior.

conta-hsverde

Vou simplificar os cálculos de geração aqui, presumo que se você está lendo esse post, como calcular qual a potência em FV que você precisa dado o consumo seja de seu domínio. Dessa forma, vou considerar que cada 1kWp gera 121kWh médio/mês.

Então, o cliente acima tem de consumo fora de ponta o valor de 81.195kWh/mês. Dessa forma, para gerarmos essa energia toda, teríamos que instalar 670kWp (81195/121).

Dessa forma, instalando 670kWp, o cliente pagaria apenas o Consumo na Ponta e os valores de Demanda (tem mais coisa, acalme-se).

No entanto, queremos que o cliente também gere energia suficiente para compensar a energia no horário de ponta.

A energia consumida na ponta foi de 8163kWh. No entanto, a energia gerada foi no fora de ponta, então precisamos usar um fator de ajuste.

Como calcular o fator de ajuste?

O fator de ajuste é a tarifa de energia do horario onde foi gerado dividido pela tarifa de energia onde eu quero compensar, no nosso caso, TEFP/TEP.

No nosso exemplo, FA = 0,37567716/0,59195628 = 0,6346272059. Dessa forma, precisamos gerar uma energia no horario FP de forma que multiplicado pelo FA o resultado seja 8.163. Podemos então, escrever a seguinte equação:

EGFP * FA = ECP, onde:

EGFP = Energia gerada fora de ponta

FA = Fator de ajuste (varia de concessionária para concessionária)

ECP = Energia consumida na ponta

Com isso, para o nosso cliente em questão, temos que:

EGFP * 0,6346272059 = 8.163

EGFP = 8.163/0,6346272059 = 12.862,67 kWh/mês.

Como o consumo na fora de ponta é de 81.195kWh/mês, mas o excedente que precisamos gerar para também abater o horário de ponta (12.862,67), precisamo gerar 94.054,67kWh.

Como definimos que cada 1kWp produzirá 121kWh/mês, precisaremos então de aproximadamente 780kWp.

Aprendi a calcular, agora, posso dar o preço ao meu cliente? Ainda não!!!!

No inicio do post eu disse que:

Quando solicitamos a concessionária a energização de um cliente do grupo A, duas informações são importantes:

  1. Potência instalada;
  2. Demanda Contratada;

Em um cliente do grupo A, NÃO PODEMOS INSTALAR MAIS PLACAS DO QUE A DEMANDA CONTRATADA A POTÊNCIA DO GERADOR FV NÃO PODE SER MAIOR do que a DEMANDA CONTRATADA.

Ou seja, nesse cliente do exemplo, como a demanda contratada dele é de 300kW, só podemos instalar 300kW de sistema FV. Com isso, a geração de energia será menor do que a queríamos anteriormente.

P.S. Para a Aneel, a potência do sistema FV é a menor potência entre a potência de módulos FV(kWp) e a potência dos inversores (kWca).

P.S. 2 Agradecimentos ao Luiz Paulo que me aviso do erro anterior.

P.S.3 Para esse exemplo especifico, considerei que a potência dos módulos é igual as do inversor.

Mas, eu posso aumentar a demanda contratada?

Sim, você pode, mas quando fizer isso, a parcela a pagar de demanda, que é fixa, vai aumentar, o que mudará a análise financeira.

E eu posso aumentar a demanda contratada para qualquer valor?

Não, ela não pode ser maior que 0,92 * a potência instalada. Se você aumentar a potência instalada, além da parte de engenharia legal junto a concessionária, você ainda precisará investimentos físicos na entrada de energia, com isso, além dos custos mensais com o  aumento de demanda, o custo de implantação ainda aumentará.

fluxo-fv

Entendendo o fluxograma acima…

  1. Calcula-se a potência de FV necessária para atingir os objetivos, normalmente, zerar o consumo do horário Fora de Ponta e do horário de Ponta.
  2. Compara se a potencia de FV (PS = Potência Solar :)) é menor que a demanda contratada (DC). Se for menor, faz-se a análise financeira, o orçamento e a proposta para o cliente.
  3. Se a potência em FV for maior que a demanda contratada, precisamos ver qual a potência instalada do cliente oficializada junto a concessionária. Se a potência instalada multiplicada por 0,92 for maior do que a potência em FV que precisamos, precisaremos apenas aumentar a demanda contratada.
  4. Faremos 2 análises financeiras, sendo uma aumentando a demanda contratada e outra sem aumentar a demanda contratada mas reduzindo a geração de energia. Após isso, fazemos o orçamento com as duas hipóteses para o cliente;
  5. Se, no entanto, a potência instalada multiplicada por 0,92 for menor do que a potência em FV que precisamos, será necessário um aumento de carga. Deveremos orçar esse serviços de aumento de carga, (com uma empresa especializada caso isso não seja nossa expertise, dependendo da potência e do estado que encontre-se a subestação, os custos podem ser muito altos).
  6. Faremos novamente 3 análises financeiras, a primeira aumentando a demanda contratada e com os custos de aumento de carga e outra sem fazer aumento de carga e aumentando a demanda contratada até o limite mas reduzindo a geração de energia, e a terceira, sem aumento de carga ou de demanda contratada e reduzindo mais ainda a geração de energia. Após isso, fazemos o orçamento com as três hipóteses para o cliente;
Flower
Aguarde calendário 2021

Vamos fazer na prática

Vamos supor que os dados de conta representado a seguir se repita os 12 meses do ano. Os dados do cliente (reais) são os seguintes:

  • Município: Rio de Janeiro
  • Potência instalada: 500kVA
  • Descrição da entrada de energia: Subestação convencional, disjuntor PVO (AEG) com proteção secundário, relé Schlumberger.
  • Tarifa: Horo Sazonal Verde
  • Demanda Contratada: 300kW
  • Custo do kWp instalado: R$ 6.500,00
conta-hsverde

Como já vimos, anteriormente, esse cliente precisaria de cerca de 780kWp para zerar a conta de energia. Vamos ao Fluxograma então.

780 é <300? Não, ou seja, precisaremos aumentar a demanda contratada. 780 é < 500*0,92? Não, precisaremos aumentar a potência instalada também. A potência instalada mínima que precisaríamos seria de pelo menos mais 350kVA, como o próximo transformador comercial é de 500kVA, precisaremos aumentar a subestação de 1x500kVA para 2x500kVA.

ANÁLISE 1 – AUMENTO DE CARGA

Primeira coisa que se precisa fazer, caso você não seja especialista em entrada de energia e MT, é encontrar um. Como eu sou, sem problemas até agora.

Pela descrição da subestação e pela atual regulamentação Light, essa subestação precisará passar por um retrofit. Além do novo transformador, será instalado uma cabine blindada, com um novo disjuntor de MT e proteção, adequações no sistema de aterramento, no quadro de distribuição (será necessário colocar os dois transformadores em paralelo, adequações na BT), o que gerará um custo de R$ 300.000,00 fora o sistema de FV.

Para o sistema de FV, a R$ 6.500,00/kWp, será necessário um investimento de mais R$ 5.070.000,00. Dessa forma o investimento total inicial do cliente será de R$ 5.370.000,00.

Após a implantação do sistema, a conta de energia ficará assim:

tabela-11

Com isso, esse investimento gerará uma economia mensal de R$ 50.005,30 ou de R$ 600.063,59.

Análise Financeira 1

Considerando os seguintes parâmetros:

  • Aumento no custo da energia de 8% a.a. nos dois primeiros anos;
  • Aumento no custo da energia de 5% a.a. após os dois primeiros anos;
  • Custo de capital (taxa de desconto) de 10% a.a. (descontados mensalmente)
  • Vida útil do projeto: 20 anos
  • Custo de manutenção 1% a.a
  • Vida útil inversores 15 anos

Teremos as seguintes resultados financeiros:

imagem2

ANÁLISE 2 – AUMENTO DE DEMANDA CONTRATADA

Devemos agora analisar financeiramente sem os custos de reforma da subestação. Para isso, poderemos aumentar a demanda até o limite de 0,92*Potência instalada. Como a potência instalada é de 500kVA, o máximo que podemos instalar será 460kWp (500*0,92).

Com isso, iremos gerar menos energia que pretendíamos, a energia gerada então será: 460kWp * 121kWh/kWp = 55660kWh/mês.

Com isso, não geraremos o suficiente nem para abater toda a energia do horário fora de ponta, ficando a conta de energia da seguinte forma:

imagem2

Como não houve aumento de carga, o investimento será apenas nas instalações de FV, que terão o custo de R$ 6.500,00*460 = R$ 2.990.000,00, para se obter uma economia mensal de R$ 28.275,85 ou  R$ 339.310,00/ano.

Análise Financeira 2

Considerando os seguintes parâmetros:

  • Aumento no custo da energia de 8% a.a. nos dois primeiros anos;
  • Aumento no custo da energia de 5% a.a. após os dois primeiros anos;
  • Custo de capital (taxa de desconto) de 10% a.a. (descontados mensalmente)
  • Vida útil do projeto: 20 anos
  • Custo de manutenção 1% a.a
  • Vida útil inversores 15 anos.
imagem3

ANÁLISE 3 – SEM ALTERAÇÃO DE DEMANDA

Vamos agora analisar financeiramente sem mexer no contrato tarifário junto a concessionária. Com isso, o máximo que poderemos instalar de placas será a demanda contratada, de 300kW. Iremos gerar ainda menos energia, sendo a energia gerada de: 300kWp * 121kWh/kWp = 36300kWh/mês.

A conta de energia será:

imagem4

Os custos de instalações serão novamente apenas os de instalações da FV, de R$ 6.500,00 * 300kWp = R$ 1.950.000,00, para se obter uma economia de R$ 20.396,58 mensais ou R$ 244.758 anuais.

Análise Financeira 3

Considerando os seguintes parâmetros:

  • Aumento no custo da energia de 8% a.a. nos dois primeiros anos;
  • Aumento no custo da energia de 5% a.a. após os dois primeiros anos;
  • Custo de capital (taxa de desconto) de 10% a.a. (descontados mensalmente)
  • Vida útil do projeto: 20 anos
  • Custo de manutenção 1% a.a
  • Vida útil inversores 15 anos.
imagem5

Resumo

Como podemos ver na tabela abaixo, a rentabilidade altera em função da carga instalada e demanda contratada do cliente. A opção de limitar a potência de placas na demanda contratada é a que traz maior rentabilidade, apesar de não zerar o consumo do cliente.

imagem6

Qual a melhor opção? Não sei, a escolha é do seu cliente, o dinheiro é dele, ele deve avaliar o que é melhor. Mas, você precisa saber dessas opções, pior coisa que pode acontecer é você não saber e seu concorrente, sim. A percepção que fica é que ele é mais confiável e competente que você.

Limitações

A conta de energia é real. Os custos de instalações em todos os casos estão dentro da ordem de grandeza, mas orçar por kWp é meio forçar a barra para esse tipo de instalação. Considerei também que não há limitação de espaço para a instalação e que não terá sombreamento significante. Na ótica do cliente, que é o que interessa, ainda faltam os custos do acesso e possíveis adequações que ele precise fazer que por ventura não estejam no escopo do FV (exemplos, análise e/ou reforço de estrutura, impermeabilização, dentre outros).

O objetivo é demonstrar que as limitações de um cliente no Grupo A precisam ser analisadas sobre a ótica técnica e financeira.

Salvar

Salvar

3 respostas

  1. E como eu calculo o consumo médio mensal se só tenho os dados de demanda mensal ponta e fora ponta? Abç

  2. Vinicius, boa tarde.
    Cezar Magalhães falando aqui.
    Li seu artigo, muito bom, parabéns
    Tenho dúvidas quanto ao dimensionamento do sistema para o grupo A, (estou falando de uma conta THS Verde A4).
    – Na conta de energia “CEMIG” tem Demanda HP e Demanda HFP, cada uma tem seu valor. Para saber a demanda contratada somo as duas e divido por dois, ou só considero a demanda HFP?
    – Esses valores de demanda contratadas variam mês à mês, o valor para o calculo é a média da demanda nos últimos 12 meses?
    Muito obrigado,
    Tenha uma boa tarde.

Vinicius Ayrão

Vinicius Ayrão, carioca, apaixonado por energia elétrica, seus conceitos e práticas. Graduado em engenharia eletrotécnica, com pós em gestão de projetos e trajetória empreendedora.

Confraria | Comunidade VAF

On Demand | Consultoria

Oportunidades

Biblioteca do Engenheiro

Cursos

Nos Siga nas Redes Sociais

Conhecimento dividido multiplica!

“Se eu vi mais longe, foi por estar sobre ombros de gigantes.” Isaac Newton.

O nosso principal objetivo no blog é dividir e disseminar conhecimentos em instalações elétricas, solar FV, segurança em eletricidade e gerenciamento de projetos. É minha contribuição em reconhecimento a todos aqueles cujos exemplos e conhecimentos me fizeram caminhar na profissão, principalmente a meu pai, o engenheiro Luiz Venancio.