No dia 11/04 tivemos mais uma Audiência Pública sobre a revisão da Resolução 482, em Fortaleza/CE.
Resolução 482 – Do que trata?
Só para todos saberem do que estamos falando, a REN 482/2012 (Resolução Normativa 482) é a que trata das regras de Geração Distribuída para Minigeração e Microgeração Distribuída.
Eu sempre considerei que ela era importante apenas para quem está diretamente envolvido no setor, mas refletindo melhor, cheguei a outras conclusões.
E para quem é importante?
Mas, pelo visto, a ANEEL não.
O que está se discutindo?
Em resumo, a revisão da Resolução 482 está discutindo se deve mudar a paridade entre a energia gerada injetada na rede e a energia compensada, que hoje é 1:1.
(Para mais detalhes, veja os posts da Bárbara Rubim: http://bit.ly/Resolucao482-1 e http://bit.ly/resolucao482-2.
Resenha da Audiência Pública
Vamos ao objetivo do post, que é minhas opiniões pessoais sobre a Audiência Pública.
Vou confessar que nunca confiei muito em Audiência Pública, sempre achei que era apenas para agradar a massa, pois o jogo já estaria decidido.
Dessa vez, me convenceram que não é assim, e lá fui eu.
Primeira conclusão que tive foi a que eu sou ingênuo.
Abertura da Aneel
O evento começa com uma abertura da própria agência, explicando o que estava em discussão e fatores relevantes.
Nesse momento, eu descobri que estava no lugar errado.
A pessoa que estava apresentando (lamentavelmente não lembro o nome, se lembrarem, coloquem aí nos comentários) afirma que EMPREGO NÃO É PROBLEMA DA ANEEL.
(ele falou isso de forma mais polida, mas nós entendemos).
Levando-se em consideração que temos 14 milhões de desempregados, país em crise, economia que não cresce, essa afirmação foi, no mínimo, infeliz ou representa uma completa desconexão com a sociedade.
Depois dessa, eu resolvi até olhar a Missão da Aneel.
Missão da ANEEL
Proporcionar condições favoráveis para que o mercado de energia elétrica se desenvolva com equilíbrio entre os agentes e em benefício da sociedade.
Benefício da Sociedade
Se eu bem entendi, o objetivo é garantir que o saldo final à sociedade no longo prazo seja positivo.
Para tanto, a ANEEL busca quantificar os benefícios e custos à sociedade, e com isso, aplicando preceitos de matemática financeira e análise de investimentos, calcula o resultado.
Na teoria, bem legal. Basta verificar as premissas, e após isso, basta calcular.
#SQN
Ao não dar valor a geração de emprego e renda a ANEEL não coloca todos os benefícios na conta, logo, o resultado final é falho.
Por que não entra na conta?
Não sei, lobby das distribuidoras, falha, incapacidade de calcular, falta de coragem de decisões difíceis?
Não me pergunte.
Falaram contra isso?
Sim, alguns palestrantes, talvez tão surpresos e revoltados quanto eu, abordaram em suas exposições.
Teve os que abandonaram o script original e falaram de improviso, pois chegaram a conclusão que a técnica, mesmo correta, encontraria resistência.
Os que sugeriram a quem disse que emprego não era importante que pedisse demissão (até ofereceu emprego para ele, por 1 S.M.).
Mas, sobre esse ponto, geração de emprego e renda, destaco a apresentação de Julio Martinez, da Orion Consultoria.
Julio destaca a importância do trabalho como resgate da cidadania.
Ele vai mais a frente, ele mostra o trabalho realizado em 2012 com energia solar fotovoltaica.
Conta como isso fez diferença para aquelas pessoas.
O mais curioso é que o Julio não é brasileiro. Ao conversar, ele me diz que está muito feliz em devolver algo ao País que o acolheu tão bem.
E para a ANEEL? Isso não entra na conta…
E a técnica?
Está bem, será que os números da ANEEL estão certos? Melhor, as premissas?
Alguns dos principais pontos abordados:
Fator de Simultaneidade
Palavras bonitas, não?
Em resumo, se discute o quanto da produção de energia FV é consumida imediatamente para as usinas de geração local.
Meus caros leitores vão pensar, e como saberemos quanto isso é?
O Brasil é um país extenso, de culturas e hábitos diferentes. Podemos pressupor que a estatística deva ser altamente complexa.
Lêdo engano. A ANEEL usou como fator de simultaneidade um levantamento realizado no Bairro de São Geraldo, em Campinas, realizado pela CPFL.
Viu, descobrimos que o Brasileiro médio vive em São Geraldo.
A Solarview possui mais dados que o estudo da CPFL e chega a valores totalmente díspares que a ANEEL.
Isso mostra que o estudo está mal feito e é inexplicável, em meu ponto de vista, a ANEEL iniciar um processo dessa importância com estudos dessa forma.
ABSOLAR
A ABSOLAR rebate alguns itens da ANEEL, como:
- Tamanho típico do Sistema FV Residencial para geração local. A ANEEL considera 7,5kW e a ABSOLAR mostra que 78% dos consumidores residenciais estão nessa faixa. Realmente não entendo a que cálculo estatístico é esse que a ANEEL faz.
- Custo de Capital PF. A ANEEL entende que para pessoa física o dinheiro não tem custo (alguém me explica isso?).
- Custo de Capital PJ. A ANEEL entende que o custo capital é de 8% a.a. Alguém pode me dizer onde está esse dinheiro?
E ainda traz estudos californianos, mostrando que lá houve ganho para os não prossumidores.
Está bom ou quer mais?
MRV
A MRV mostra que as pessoas de menor renda também tem vez na geração de energia distribuída.
Difícil discutir com todos os números que ela apresenta.
E só para lembrarmos, o negócio da MRV não É FV.
Minha opinião
Eu não pedi a palavra, irá por escrito nessa semana.
Mas, acho que uma coisa importante está sendo desconsiderada.
A INCERTEZA.
É possível usar uma análise cartesiana sobre Energia? Aliás, sobre negócios?
Qual empresário hoje não é obrigado a rever seu plano de negócios quase todos os dias?
Como analisar a GD sem analisar o efeito do armazenamento no Futuro? Ou o advento do carro elétrico? Blockchain e smart grid?
E o nosso uso da energia, quais os impactos no planeta e nas gerações futuras?
A inviabilização da GD nesse momento significa entraves sérios para novas soluções.
O desenvolvimento da GD, a liberdade de poder escolher como consumir energia, de buscarmos novos modelos de negócios, tudo isso tem potencial enorme.
Potencial para desenvolvermos junto com o mundo e não mais atrasados, como foi com a Solar.
Minha proposta é muito simples.
Não mude nada, abra um processo de fusão da Resolução 482, da resolução 414 e se avance no smart grid e no armazenamento.
Tudo em uma única resolução.
E para tal, que os estudos necessários sejam encabeçados pelas principais Universidades do País (temos várias com condições), com participação de todos os atores da sociedade.
A proposta apresentada pela ANEEL nasceu cheia de falhas de premissas.
Se fosse a fundação de um prédio, cairia. Uma instalação elétrica, incendiaria.
A melhor coisa que a ANEEL tem a fazer é jogar esse estudo fora e começar do ZERO.
Faça a sua parte
Você ainda pode fazer a sua parte. Até o dia 19/04 a ANEEL estará recebendo as contribuições pelo email:
ap001_2019@aneel.gov.br
Para saber mais sobre a revisão, consulte o site da ANEEL em:
36 respostas
O principal prejudicado no modelo atual não são as grandes distribuidoras, pois a perda de receita é compensada nos reajustes anuais. Aliás, a grande maioria das distribuidoras fazem parte de um grupo no qual possui em sua composição também empresas de soluções em GD, portanto mesmo que “perdessem” de um lado, “ganhariam” do outro.
Na regra atual, a GD tira o mercado de referência da distribuidora contribuindo zero com os custos das distribuição. Este mercado expandiu de uma maneira tão acelerada após a Res. 687 que esses volumes já não são irrisórios perante ao mercado da concessionária, e não me parece justo que demais consumidores tenham que subsidiar os que possuem condições de investir em uma GD. Portanto, o principal prejudicado é o consumidor cativo comum.
Na minha opinião, a alternativa 1 apresentada pela ANEEL (cobrança apenas da TUSD fio B) é a mais justa a ser seguida, pois remunera os custos em BT da distribuidora e não impacta tanto na viabilidade dos projeto de geração distribuída.
Quando você comenta sobre o estudo da CPFL, não penso que seja a qualidade que conte, mas sim o fato que é um estudo da CPFL.
Apenas essa crítica que você apontou já me grita o vício de todo esse teatro.
Posso estar enganado,mas o chefão da ANEEL foi empossado pelo Temer no apagar das luzes . Não sei se é possível, mas ainda não entendi porque Bolsonaro ainda não trabalhou neste assunto pois energias renováveis estavam em sua plataforma . Acredito que sou um dos pioneiros em energia solar no Brasil, já tenho mais de 20 anos neste campo.
Energia Solar somente se tornou relevante a partir da RN 482.
Mas infelizmente, como dizia Shakespeare, a mais coisas entre o céu e a terra do que imagina sua vã filosofia !
Sempre vai haver um idiota no lugar certo para atrapalhar tudo !
Continuo pensando que estas audiências são mera perda de tempo, o que eles querem já esta definido …
Eu fiquei com essa mesma impressão. Já tinha esse pré conceito, mas a audiência meio que me confirmou mais. Vamos ver se eles terão a desfaçatez, de após os posicionamentos ainda manterem as alternativas tortas que propuseram.
Infelizmente isso aqui resume o circo da ANEEL:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Captura_do_regulador
Triste…difícil provar, mas tá na cara que é isso.
Não tinha lido ainda, mas dá o que pensar. Obrigado por trazer o texto.
Parabéns Vinicius. Que seu trabalho renda bons frutos e a Aneel reconsidere suas premissas.
Sou empreendedor no setor de pirólise e plasma para a geração de energia renovável focado em GD.
Saiba que toda essa instabilidade gerada pela própria Aneel tem afastado os investidores com quem mantenho tratativas.
Estamos reconsideração partir para o mercado livre, infelizmente.
Enquanto isso, adoramos nossas térmicas que rodam a combustível fóssil!
Luis Fernando
Lixo Verde
Obrigado Luis.
Essa instabilidade, aliás, a falta de uma verdadeira politica de estado nos prejudica demais (ao País).
Parabéns…. ótima abordagem .
Obrigado Mário.
Excelente reflexão…Parabéns pela coerência!!!!
Obrigado Janilson.
Parabens amigo Vinicius.
Somente participando dos debates e dando nossa versão da realidade poderemos mudar o futuro, porque o presente é fruto da nossa negligencia ou da nossa proatividade, depende das nossas escolhas no passado.
Forte abraço.
Grande Normando, apenas sigo o exemplo dos mentores. Grande Abraço.
Sinceramente não consigo entender o porque a Aneel esta fazendo esta mudança em um setor que tem um futuro fantástico. Com certeza a mudança vai acontecer e vai colocar um freio no uso da energia solar, se a mudança fosse para aumentar o uso de soluções renováveis ok. Acho que o poder técnico não vai conseguir mudar algo que eles tem como certo, somente uma interferência do governo poderá barrar esta mudança.
Mauricio, a análise recorrente e verificar os ajustes necessários é necessário. O problema, em meu entendimento, é que o viés não está em Prol da Sociedade e sim das concessionárias, que é de onde a maioria da diretoria da #aneel em seu Palácio de Cristal saíram.
Grande participação e contribuição com sempre neste tema, parabéns .
Obrigado Gladyston.
Parabéns, Vinicius.
Posicionamento de grande importância, com informações cruciais, de forma objetiva. Façamos a nossa parte!
Obrigado pelo comentário Anderson. Forte Abraço
Parabéns pelo olhar crítico Vinícius. Também assisti ao circo, muita paixão no ar, dinheiro demais envolvido. Os senhores da ANEEL não levam em conta o desemprego, não tomam conhecimento de que o incentivo à GD com renováveis pode nos dar o conforto de desligar as térmicas caríssimas e poluidoras, não levam em conta que o SIN é interligado (pleonasmo) e que já temos UHEs suficientes para nos dar segurança energética, pois com o incentivo ao uso de fontes renováveis e GD, nos permitiríamos ao luxo de estocar a água das UHEs e usá-las apenas nos momentos onde nos fosse conveniente, não consideram que não precisaríamos continuar construindo usinas a fio d’água, não tomam conhecimento de que o estímulo à produção de biogás nos ajudaria a transformar passivos ambientais em ativos na forma de energia, é como você disse, superficial demais esse estudo da ANEEL. Toda essa árvore do MME está precisando levar uma bela sacudida, vai espirrar cupim pra tudo que é lado. Tem o discurso da EPE (também MME) de “uma das matrizes energéticas mais limpas do planeta”, quando o que se deveria frisar é que a participação de não Renováveis na nossa Matriz Energética é bastante superior ao de Renováveis, na ordem de 57% de Fontes NÃO Renováveis para 43% de Fontes Renováveis. Mesmo com todo esse potencial que temos de sol, vento e biomassa, o uso de não renováveis ainda supera o de renováveis! Mas todos esses senhores estão daquele jeito, como diz um ditado: “estão com o boi na sombra”, não precisam se preocupar com nada. Pouco importa a eles o desemprego que assola o País, pouco importam metas ambientais, o que vale é cumprir as metas dos Lobbys e conchavos já firmados. Vou tentar colar um Link aqui, não sei se as configurações da tua página permitem. É em relação ao Lobby que ocorreu no ano passado para apontar a Direção Geral da ANEEL, uma triste realidade. Lamentável, o mesmo acontece na ELETRONORTE, ELETROBRÁS, todo o MME, que parece que não é à toa que começa com a letra ‘M’ de Maranhão. Dá uma olhada no Link, um abraço. https://br.reuters.com/article/businessNews/idBRKBN1ET1QF-OBRBS
“também assisti ao circo..”. É realmente eles ainda acreditam que pão e circo é o suficiente para as massas. Torcer para não terem razão. Obrigado pelo comentário.
Forte Abraço.
Camarada, ótimos apontamentos.
A linha que perpassa isso tudo é apenas uma: se a agência realmente brigar por segurança energética, o preço da energia cai, pois cai a incerteza associada ao fornecimento.
O sistema é cada vez mais privado, mais livre, mais voltado ao lucro.
Energia barata minimiza o lucro.
O lobby que capturou os orgãos reguladores obviamente não podem permitir isso.
Muito importante sua contribuição e principalmente posicionamento sobre esse assunto Vinicius.
Conforme comentei no grupo em que recebi o link deste artigo: Já admirava os seus artigos antes. Agora ainda mais!
Espero que tenha inspirado muitos outros a também se posicionarem!
Grande abraço!
Renan, obrigado pelo carinho. Será que aparecerão mais chatos? 🙂
Forte Abraço.
Parabéns pelo artigo Vinicius.
Lamentavelmente a lógica econômica fria faz parte da tomada de decisões de executivos dos entes regulatórios.
Mais nosso papel é o de sermos a mosca na sopa deles!!! ( Raul).
E sempre lembrar da existência de um país Real com todas suas contradições.
Um grande abraço.
Att.
Julio, esperamos entãos er muito MOSCA até eles terem indigestão. Obrigado pelo comentário.
Concordo contigo Vinícius, muito bom seus comentários!!!! Grande abs Wagner Weidmueller.
Grande Ogura, prazer ter você por aqui. Precisamos marcar um chopp para podermos colocar os “causos” em dia.
Forte Abraço.
Infelizmente não pude participar da audiência, mas tinha assistido uma apresentação da Aneel em um evento ocorrido mês passado e tive estas mesma sensações tão bem descritas neste texto. Infelizmente há um descasamento da agência com a realidade econômica e social em que vivemos e, como você mostrou, esquecendo de forma conveniente a relevância e impacto social trazidas por suas decisões. Lamentável.
Parabéns pelo texto, Vinicius.
É lamentável que uma agência reguladora seja um órgão mais político do que técnico, e de uma superficialidade que espanta (pelo nível do salário que eles recebem e da qualidade que deveriam retribuir).
Germano, vamos continuar tentando fazer a nossa parte. Obrigado pelo comentário. Abraços,
Vinicius
Grande Vinicius, parabéns pelo excelente texto… por descrever de forma clara e objetiva o sentimento de nossa classe e o descaso por parte daqueles que deveriam promover o crescimento e fomentar o desenvolvimento energético e econômico da nação.
Obrigado meu amigo. Continuamos na luta! Grande abraço.
Muito bom
Obrigado Carlos.